Olá, senhores. Como combinado anteriormente, continuando a discorrer sobre o Trabalho em um outro post, pois o anterior ficou muito grande. Continuar a falar sobre o tema em um único post o tornaria excessivamente grande, e este é um blog razoável. Por isso dividi em dois posts, e se esse ficar muito grande, também o dividirei. Tudo para melhor atender a você, nobre leitor que encontra tempo para sorver minhas palavras como um filho que suga alegremente os seios rijos de sua mãe.
Enfim, no post passado eu ia dizendo que com a Idade Moderna (que para os fins
deste blog não é a idade moderna histórica, mas sim a sociológica, incluindo,
assim, a Idade Moderna e a Idade Contemporânea históricas), o trabalho passou a
ser a base da sociedade, e objeto de culto de toda a humanidade, praticamente.
O advento do
capitalismo fez do trabalho simplesmente a mola propulsora do mundo. Tanto é
que o capitalismo se baseia na eterna luta entre o capital e a força de
trabalho. Especialmente o protestantismo foi fundamental para a popularização
desse modelo de pensamento, visto que vários protestantes adaptaram o
capitalismo aos princípios cristãos interpretados conforme o protestantismo,
especialmente em livros como A ÉTICA PROTESTANTE E O ESPÍRITO DO CAPITALISMO,
do economista e filósofo alemão Max Weber.
Apenas para dar
uma amostra do que o trabalho significou nessa época, trago a frase de famoso
autor do período ao elaborar consideração sobre o trabalho:
"Ser obrigado a trabalhar, e obrigado
a fazer o melhor possível, cria em você moderação e autocontrole, diligência e
força de vontade, ânimo e satisfação, e cem outras virtudes que o preguiçoso
nunca conhecerá." (Charles Kingsley)
Claro que também
há o lado totalmente negro da questão. O capitalismo do Estado Liberal aliados
à ausência de uma cultura de direitos humanos foi extremamente prejudicial para
os trabalhadores, que passaram, como sabemos, pelo período mais complicado de
sua história desde a escravidão, na minha opinião. E isso tudo com uma certa
conivência do cristianismo, notadamente do protestantismo, não se pode negar.
Não à toa Karl
Marx escreveu que "a religião é o ópio do povo", pois no Ocidente
cristão os pregadores apenas exaltavam como era bom trabalhar, como era
enobrecedor, sem se preocuparem com as condições ou com a dignidade do trabalho.
Especialmente na doutrina protestante, isso ficou mais do que evidentes,
especialmente por que, como já expliquei em outros posts, o protestantismo não
tem problemas com a riqueza e com o acúmulo de riquezas, diferentemente do
catolicismo onde a pobreza não é obrigatória, mas fortemente encorajada.
Ou seja, tirando o
ateísmo puro e simples, o que Marx queria dizer é que a religião acabava
cegando os trabalhadores para o fato de estarem sendo oprimidos. Ou seja, ela
era apenas uma mentira, um instrumento dos quais os poderosos se utilizavam
para se manterem no poder etc etc. NESTE ponto, eu concordo com ele, que a
religião acabou sendo infelizmente usada nesse sentido, e nem foi por mal.
Apenas o lado social ainda não era visto como passível de sofrer influência
religiosa, e até hoje os protestantes em sua maioria se mantém alheios aos
acontecimentos sociais. Aliás, muitos dos mais conservadores negam até mesmo a
participação da humanidade no efeito estufa. A gente tem dessas coisas, nós
cristãos...
Se alguém quiser
se aprofundar nessa questão, basta ler um pouco de Jack London, autor
socialista que eu admiro muito. Cristão, a maioria das constatações que eu faço
foram inspiradas nele, ma também no próprio Marx e em outros comunistas,
inclusive alguns hereges, como comunistas convertidos ao cristianismo e adeptos
da teologia da libertação, como o Frei Carlos Mestres. A despeito de ser
material essencialmente herético, sobre o qual a Santa Igreja de Roma
constantemente nos adverte, em meus estudos sobre tais desvios da fé isso foi o
que pude extrair de verdadeiro, e o resto é realmente uma tristeza de se ler,
muito equivocado, os caras começam bem mas depois enfiam os pés pelas mãos.
Dando prosseguimento, a religião estava passando por um período complicado. Voltar-se para si mesma tentando se preservar ou partir para uma aplicação prática de seus próprios ensinamentos, em uma época conturbada onde a dignidade do homem estava sendo totalmente defasada?
A resposta a essa pergunta, pelo menos em termos católicos, tem um nome: "RERUM NOVARUM: sobre a condição dos operários." Trata-se de uma encíclica simplesmente revolucionária. Para quem não sabe, uma encíclica é, basicamente, uma carta papal, onde ele trata sobre temas diversos, sempre relacionados de alguma forma à moral ou à religião. Dentro do catolicismo, é vocação do Papa unificar a Moral Cristã, dirimindo os conflitos quanto à interpretação das Sagradas Escrituras e sua aplicação na vida prática. A Encíclica difere da correspondência papal fechada, endereçada a pessoas específicas, porquanto é aberta a todo o mundo. Qualquer um pode pegar uma cópia e ler o documento.
Ah, sim, eu já ia me esquecendo. Ninguém tem obrigação de saber latim, por isso esclareço logo que RERUM NOVARUM quer dizer ao pé da letra "Das Coisas Novas". Isto posto, nesta encíclica o Papa Leão XVIII abordou basicamente (veja bem, BASICAMENTE) a questão social com relação à Igreja, ao Estado, o Socialismo e a ação conjunta dos trabalhadores e empregados.
Esta Encíclica é de suma importância para a Igreja Católica porque marca o início e também a sistematização de sua Doutrina Social, que é basicamente como a Igreja age com relação à sociedade e com relação á economia, especialmente com relação ao capital e ao trabalho. Como este é um blog razoável não vou me alongar muito neste tema. Não posso, porém, evitar citar um trecho que muito me agrada deste documento:
"Quanto aos ricos e aos patrões, não devem tratar o operário como escravo, mas respeitar nele a dignidade do homem, realçada ainda pela do Cristão. O trabalho do corpo, pelo testemunho comum da razão e da filosofia cristã, longe de ser um objecto de vergonha, honra o homem, porque lhe fornece um nobre meio de sustentar a sua vida. O que é vergonhoso e desumano é usar dos homens como de vis instrumentos de lucro, e não os estimar senão na proporção do vigor dos seus braços."No plano do Direito do Trabalho, essa encíclica foi fundamental para humanizar as relações de trabalho sem a necessidade de se recorrer aos sistemas econômicos alternativos, como os socialismo e o comunismo. A Igreja Católica, usando de sua influência no mundo ocidental, pontificou a favor da dignidade do home trabalhador, e seu poder de persuasão moral, mesmo em sua decadência, ainda foi capaz de modificar de uma tal maneira as relações de trabalho que hoje qualquer aluno de cursos como Administração ou Direito debruça-se sobre este maravilhoso documento, dada sua importância no formação do próprio Direito do Trabalho.
Olhem só como era uma graça esse homem:
Depois, chamo a atenção para a Tiara Papal, conhecida como "a Coroa que é adornada com três coroas", ou, em latim, TRIREGNUM. A Atual Tiara Papal geralmente é constituída de prata com três coroas de ouro, encimadas por uma ogiva encimada por uma cruz. A Tiara Papal, como tudo mais na Igreja Católica, tem uma tradição tão grande e significados tão diversos que eu nem vou falar dela nesse post, se não o tema se perderá totalmente.
Bom, gente, mais uma vez o post está tomando dimensões por demais extensas, e novamente terei que parar com esta digressão. Mas já estou terminando. Creio que mais um post apenas será suficiente para encerrar a questão. É que eu me empolgo, me desculpem. O conhecimento é simplesmente apaixonante!
DOMINUS VOBISCUM! (O Senhor esteja convosco!)
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