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sexta-feira, 20 de abril de 2012

A maldita instrumentalização da informação

Cada vez que eu passo os olhos pela "timeline" do meu facebook, cada vez que eu me envolvo em um debate sobre seja lá que tema, salvo em raras companhias, cada vez que eu leio um Estadão, uma Folha de São Paulo, um Diário do Amazonas; cada vez que eu leio alguma revista como Época, Veja ou Istoé; enfim, cada vez que eu me deparo com qualquer veículo de opinião, seja para as massas seja para um público restrito, não tem jeito, eu fico triste.

Não, não sou um reacionário conservador controlador  daqueles a quem a simples menção da expressão "liberdade de imprensa" é como um murro na boca do estômago depois de ter ido a três feijoadas seguidas seguidas de um churrasco e um rodízio de pizza ou um par de cornos em plena lua-de-mel. Onde é a lua-de-mel, não importa.

O que me entristece, me chateia, é a mesma coisa que talvez tenha chateado e feito caírem mais cedo os cabelos de Sócrates há milênios. E não, também não é um problema com os que estão ao nosso redor. Sei lá, talvez até seja. Mas quando todos estão doentes, a doença se torna o padrão de saúde, e os sadios é que passam a ser considerados como portadores de algum mal sinistro.

O que me entristece, finalmente indo ao ponto, é que hoje em dia ninguém mais quer saber da verdade. Hoje em dia as pessoas só querem saber de opinião. De preferência, a delas, mesmas. Cada vez mais, com essa cultura do relativismo, deixa-se de lado aquele ideal da busca da verdade absoluta e libertadora, e passa-se a um raciocínio conformista e tendencioso de cultivar meias verdades, verdades incompletas, opiniões, suposições e, finalmente, mentiras.

Cada círculo ideológico da sociedade procura dominar os meios de comunicação para fazer valer o seu modo de pensar. Evangélicos lotam a televisão com um sem número de canais de pregação. Setores políticos e empresariais compram e ditam o que será dito pelas principais revistas e jornais do nosso país. Famílias donas de grandes emissores como a Globo doutrinam maliciosamente o povo com o seu próprio modo de ver as coisas, impondo suavemente seu modo de ver o mundo às massas incautas que se ajuntam aos milhões em frente àquelas caixas metálicas do inferno no horário nobre. Muitas, iludidas, sonhando em um dia serem nobres, também.

Os mais malandros dentre os homens sempre souberam da importância crucial da informação e dos seus meios de produção, e procuraram sempre o monopólio desse sistema. O monopólio, não do pensamento, porque efetivamente isto (ainda) é impossível, mas do modo de pensar. Exemplos do mundo antigo não faltam, mas prefiro citar um caso da Idade Média, porque todos o conhecem bem. Falo do monopólio da informação exercido pela Igreja Católica Romana.

Muito embora não tenha sido essa coisa horrorosa que muita gente acredita (influenciadas por outro monopólio da informação, posterior), efetivamente a Esposa de Cristo foi uma madona muito controladora enquanto esteve a frente do mundo ocidental. Há de se ressaltar que a Igreja era, quase sempre, a única interessada na conservação e aprimoramento do próprio conhecimento, com ordens inteiras de padres e monges dedicados a copiar e escrever livros das mais diversas áreas, enquanto os reis estavam ocupados demais guerreando e pensando em esposas para seus herdeiros; há ainda de ser ressaltado que a Igreja fundou o sistema universitário. Basta olhar no mapa da Europa e buscar pelas primeiras universidades para ver que todas elas nascem do seio da Igreja, muitas existindo até hoje, como a se Salamanca, na Espanha.

Ainda assim, foi um monopólio em algumas épocas severo, notadamente na Inquisição e nos conflitos de ideias com o Iluminismo que surgia rápido entre nossos pensadores, rápido demais, segundo julgo. A Igreja, por mais de mil e quinhentos anos afeita a uma única e inquestionável verdade, teve muita dificuldade em aceitar outras opiniões, que iam de encontro justamente a alguns de seus postulados mais basilares. Até hoje, como leigo, posso testemunhar a dificuldade da Igreja em discutir alguns temas, muito embora ela já tenha melhorado bastante nesse aspecto.

Hoje, basicamente, os conflitos de ideias podem ser resumidos entre a religião e a ciência. Claro que isto é uma afirmação superficialíssima, talvez mais fina do que uma membrana citoplasmática (por sinal tão fina que é semipermeável), mas preciso me servir dela para efeitos didádicos, agora. Só falei isto para introduzir meu outro exemplo, que é o exemplo dos Iluministas da Revolução Francesa. Uma das coisas que mais me revolta com relação à França é a sua revolução. Não apenas por ser um monarquista, mas especialmente pelas grandes mentiras que ali foram veiculadas como se fossem as maiores verdades do mundo.

Todos sabemos que a revolução, apesar da ampla participação do povo, na verdade foi arquitetada pela burguesia iluminista, que ansiava tomar o poder que estava nas mãos do clero e da nobreza. Pois muito bem, para chegar a esse intento, valeu-se a classe comerciante da maravilhosa invenção de Gutemberg, a saber: a imprensa. Muitos jornais surgiram naquela época, de cunho revolucionário, e divulgando todo tipo de mentiras sobre o clero e a nobreza. O modo como a Igreja Católica lidou com o caso de Galileu e Copérnico, por exemplo, foi sordidamente distorcido pelos jornais e autores do período iluminista, afoitos em lançar o povo contra a Igreja. também a nobreza foi duramente difamada com todo tipo de história mentirosa.

Merece destaque especial a história da princesa Maria Antonieta, que por muito, muito azar, mesmo, era Rainha da França na época da revolução. Os anais da história contam que, quando o povo esfomeado dirgiu-se à Versalhes para reclamar que não havia mais pão, os criados da rainha a comunicaram do fato e perguntaram o que deveriam dizer ao povo. Ao que a monarca teria respondido, desdenhosa: "Ora, pois diga ao povo que comam brioche". O episódio teria sido a gota d`água para o valente povo francês, que depois de saber da terrível resposta da rainha pegou em armas e começou a matança da qual todos temos seguro conhecimento.

Ocorre que tal fala da rainha só chegou aos ouvidos da população francesa pelos periódicos da época. Os quais, como já disse antes, estavam nas mãos, (não diga) da burguesia! Indo logo ao ponto, outro dia li em uma dessas revistas de história que historiadores estão cada vez mais convencidos de que o famoso episódio não passou de um mito, criado para inflamar o povo contra a monarquia e a Igreja Católica.

Com efeito, todos conhecemos, ou deveríamos conhecer, o lado negro da ideologia revolucionária francesa, traduzido na forte frase de Diderot (inspirado, acreditem, em um padre ou em uma de suas amigas, dependendo da corrente histórica), transcrita a seguir em seu original, como consta nos arquivos da Academia Francesa de Letras:
"Je voudrias, et ce sera le dernier et le plus ardent mes souhaits, je voudrais que le dernier des rois fût étranglé avec les boyaux du dernier prêtre."
Ou, no vernáculo:
"Eu gostaria, e este será o último e mais ardente dos meus desejos, eu gostaria que o último rei fosse estrangulado com as tripas do último padre."

Cristo! Preciso dizer mais alguma coisa? Todos sabemos, ou deveríamos saber, quem foi Diderot e sua importância no pensamento da Revolução Francesa!  Mas isto não é o pior, o pior é como a frase, evidentemente muito individualista e difícil de ser engolida, foi adaptada pelos pensadores iluministas para tornar-se sedutora aos ouvidos e coração das massas, em especial com a contribuição do sr. Voltaire. Por conta disso, a maioria de nós talvez a conheça não como a citei acima, mas como a seguir a coloco, muito mais eufemística:

"A humanidade só sera livre quando o último rei for estrangulado com as entranhas do último padre"
Bem mais sedutor, bem mais sensato bem mais romântico. Bem mais atraente e fácil de veicular, não é? Bom, estou dizendo tudo isso, e poderia dizer bem mais, por ser o tema um dos que mais me atraem. Mas voltemos ao sentido do post antes que ele se perca totalmente. Perceberam como a informação, os fatos, a verdade, deixam de ser o mais importante, deixam de ser o essencial, o fim-último, e passam a ser apenas mais um instrumento de dominação da classe que controla os seus meios de produção e divulgação?

O que me faz voltar ao sentimento que primeiro me motivou a fazer esse post, e que agora me invade outra vez: tristeza. Cara, isto é realmente um enorme (palavrão - sinônimo de esfíncter anal)!

Me faz voltar também ao meu velho amiguinho Sócrates. Atrevo-me a dizer que, superado o problema inicial da linguagem e das insolúveis disparidades filosóficas entre nós, poderia, na verdade, me dar muito bem com ele. E sabem por que? Porque o velhinho lá entendia que devemos buscar a verdade, custe o que custar! Que não devemos nos estagnar com a nossa opinião, mas sempre ir além, que não devemos confiar em tudo o que nos disseram, e acima de tudo, não podemos esquecer que não somos veiculadores da verdade, mas apenas de opiniões.

A verdade, senhores, não nasce de outra fonte que não seja do diálogo, por mais demorado que ele possa ser! Nasce de eu ter a coragem de começar a me fazer perguntas, de começar a discutir com o outro, mas não para querer vencê-lo, e me isolar como um vitorioso alienado em minha rede de mentiras, mas a encontrar a verdade, que torna não apenas a mim, mas a humanidade inteira, vencedora! O que eu estou tentando dizer é que PAREM DE LER SÓCRATES, COMECEM A AGIR COMO ELE! Façam uso da maiêutica em suas vidas!

Meu post. Por Deus, meu post não tem toda a verdade! Quantos pontos falhos devem haver na minha argumentação, que apenas não sou capaz de detectar porque nunca ninguém chegou e os mostrou para mim! E, por Deus, como estou louco para que alguém os mostre! Porque, senhores, o importante não sou eu nem você, mas é a verdade!

Sim, podem me chamar de romântico, utópico, sei lá. Me xinguem aí, eu é que não vou ficar me xingando. Mas levem consigo pelo menos essa frase, que não é nem minha, nem do Diderot, nem do Sócrates, mas do mais sábio de todos nós:

Conhecereis a VERDADE, e a VERDADE vos libertará." (Jesus, o Cristo, no Evangelho de São João, capítulo 8, versículo 32)

P.S: Nesse sentido, recomendo o livro do meu xará, o jornalista Carlos Dorneles: DEUS É INOCENTE - A IMPRENSA, NÃO

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